A Rádio Clube de Santos (AM, 1240 kHz) é a quarta emissora de rádio mais antiga do País. Foi fundada em 26 de dezembro de 1924, sob o prefixo PRB-4. Deixou de ter programação comercial em outubro de 1994, quando foi arrendada à Igreja Universal do Reino de Deus.
Meu primeiro emprego foi na Clube, entre 1993 e 1994, dos 14 aos 15 anos de idade. Não tenho registro desse período em carteira profissional. Nem poderia: aos menores de idade, não se concedia autorização formal para locução nem trabalhos jornalísticos -- justamente, o que eu fazia...
A seguir, um resumo das minhas lembranças do que era a Rádio Clube naquela época, num texto que escrevi em 7 de novembro de 2010 a pedido do estudante de Jornalismo Orion Pires, colega de trabalho na redação do jornal A Tribuna, de Santos (com alterações posteriores).
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Orion,
Como eu lhe disse, posso escrever apenas sobre o período em que trabalhei na Rádio Clube (AM, 1240 kHz), meu primeiro emprego, entre 27 de setembro de 1993 e 6 de outubro de 1994, ano em que a emissora completaria 70 anos (foi fundada em 26 de dezembro de 1924 e é tida como a quarta rádio mais antiga do Brasil). Sua sede era um sobrado na Rua José Cabalero, 60, no Gonzaga, aos fundos do antigo Cine Alhambra. Os imóveis não mais existem: demolidos, deram lugar a um flat cujo nome não me lembro. Fiz parte da última equipe que manteve programação não religiosa na emissora. A partir de 6 de outubro, assumiu a rádio a Igreja Universal do Reino de Deus, que teria arrendado a programação por R$ 30 mil mensais, em valores da época. Anos depois, entre o fim da década de 1990 e o início dos anos 2000, a igreja teria adquirido a rádio (uso os verbos no condicional por não ter certeza, mas por ter ouvido comentários a respeito).
Na época, ela pertencia, fazia pouco tempo, à empresária Maria Alice Antunes Álvares Affonso, atual presidente do Diretório Municipal do Partido Popular Socialista (PPS) em Santos. Ela foi casada com o ex-deputado estadual Rubens Lara, morto em 2008, mas não me lembro se ainda eram marido e mulher naquele tempo. O superintendente da emissora (a quem pedi trabalho) era José Rubens Marino, que até o ano retrasado foi secretário de Esportes de Cubatão. Teve dois diretores artísticos: Paulo Filgueiras Júnior (dono de um dos maiores acervos de discos do Brasil, algo como 60 mil LPs; ao menos, era o que eu ouvia dizer; ficou lá mais ou menos até agosto de 1993) e Antonio Aguillar (meu primeiro chefe, responsável por programas na TV Record na época da Jovem Guarda, na década de 1960; com ele, fiz um teste de locução e, no mesmo dia, 20 de setembro, gravei um comercial, veiculado pela primeira vez num sábado, 25/9 — Dia do Rádio).
Até poucos meses antes de eu entrar na Clube, ela pertencia ao Pelé. Era a oitava e última colocada em audiência entre as emissoras de Santos e região. Após a venda à Maria Alice, a renovação dos programas e de parte do pessoal levou a emissora, em menos de seis meses, ao segundo lugar em número de ouvintes, conforme medições da época. Só perdia para a Rádio Cultura, líder entre as rádios AM locais desde a década de 1960, pelo menos. A Clube já estava nessa boa situação antes de eu entrar lá.
Um dos destaques da programação era o Departamento de Jornalismo, dirigido, em diferentes períodos, por Raul Christiano, Marcelo Di Renzo (nosso professor da UniSantos, por intermédio de quem ingressei no setor) e José Carlos de Oliveira (radialista, locutor da Rádio Local, do Santos Futebol Clube). Havia duas edições do 'Rádio Clube Jornal', das 7h30 às 9h30 (de segunda-feira a sábado) e das 18h30 às 19 horas (de segunda a sexta; apresentei esse jornal uma vez, em dupla com Douglas Gonçalves); das 18 às 18h30, a 'Revista da Clube' (de segunda a sexta), um programa jornalístico mais leve e com conteúdo de variedades. De hora em hora (acho que às 11, 12, 13, 14, 15, 16, 20, 21 e 22 horas, de segunda a sexta), o 'Clube Notícias', boletim informativo com duração aproximada de três minutos. O setor tinha equipes de manhã, à tarde e, ao menos, um plantonista à noite. Informações chegavam da 'Agência Estado' via telex. De maio a outubro de 1994, trabalhei lá como radioescuta, no período da tarde; ouvia a CBN, transcrevia depressa o que podia e fazia um novo texto, com o resumo das informações que anotava, datilografado e em duas vias produzidas em papel carbono para os locutores.
Alguns dos jornalistas e radialistas da Clube, em minha passagem por lá, eram Douglas Gonçalves (apresenta o 'Balanço Geral', na Record, atualmente), Nísio Lemos, Raul Christiano, Marcelo Di Renzo, Douglas Pereira, Ronaldo Abreu Vaio (que só conheci aqui no jornal; ele trabalhava de manhã, e eu, à tarde), Roberta Barbosa, Fernanda Silvestre, Cândice La Terza, Luciana Julião, Cláudia Castro, Luciana Frangeto, Vanessa Rodrigues (xará de nossa colega fotógrafa no jornal), Valter Magalhães, Bruno Abud (mais tarde conhecido como Bruno Kauffmann, morto em 2004, aos 31 anos, num acidente com o carro que dirigia para a EPTV, afiliada da Rede Globo em Ribeirão Preto), José Luiz Lopes (o 'seu' Dito, locutor da casa por mais de 50 anos, que naquele período morava na emissora, como zelador), Hudson Marcondes, Cícero Andrade, Bone Jr., César Pinguim (ligado ao samba), Clóvis Valverde, Ataídes Rabelo (discotecário, ou seja, responsável pela programação musical), Renato Costa (hoje na Rádio Guarujá AM), Oneyda Masch (uma das mais antigas radialistas do País, iniciou a carreira em 1943 como radioatriz, parece-me que aos 13 anos), César Neto (creio que ainda seja assessor de imprensa da Portuguesa Santista), Vitor Moran, Orlando José, Walmir Lopes, Eduardo Lucas, Thiago Paes (quatro meses mais novo do que eu e que, três meses antes de mim, em junho de 1993, havia entrado na emissora como atendente de telefone em programas da emissora, no período da tarde; nós nos formamos juntos em Jornalismo pela UniSantos, em 2000, e creio que ele ainda trabalhe como radialista na Rádio Guarujá FM); locutores esportivos como Kledir Oliveira, Odinei Ribeiro, Davi Guilherme; operadores de áudio e estúdio (gravação) como José Carlos dos Santos, o Periquitão, Luiz Cláudio Brito, Roberto Húngaro, Isabel Lemes, Eddie Júnior.
Quando a Universal tomou conta da rádio, cerca de 50 pessoas, registradas ou não (meu caso), foram dispensadas. Poucos operadores de áudio restaram. Soube que um deles se converteu à igreja. Mas, de resto, eram pessoas ligadas a essa religião que mantinham a emissora no ar depois da saída dos profissionais e aprendizes.
Vale um parêntese: de algum modo, e eu não percebia isso direito na época (entrei lá com 14 anos), havia ingerência política na emissora. Não digo interferência no conteúdo dos programas jornalísticos, mas por certas relações que se resumem assim, na minha avaliação:
1. Raul Christiano é um dos fundadores do PSDB, criado em 1988 (portanto, um partido político recente, mas que, em 1994, lançaria Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República);
2. Rubens Lara (a quem nunca vi na emissora) era marido ou ex-marido de Maria Alice Affonso. Ele também era filiado ao PSDB;
3. Maria Alice era cunhada do ex-ministro Almino Affonso, que nas eleições nacionais de 1994 concorreu a deputado federal. E posso relatar uma tentativa velada de promover sua candidatura: em meados de 1993, a rádio promoveu um concurso para que os ouvintes enviassem cartas propondo um slogan para a emissora. Venceu a frase "Clube, a rádio que escuta você", que, segundo chamadas veiculadas durante a programação da época, foi escolhida "entre 4.562 cartas". O número com que Almino Affonso concorreu à Câmara Federal, no ano seguinte, era 4562;
4. Certa vez, num sábado pela manhã (agosto ou setembro de 1994), eu estava andando pelo Embaré, na esquina da Rua Osvaldo Cóchrane com a Avenida Epitácio Pessoa. Coberto por um lençol branco, estava o cadáver de um homem. Como pensei ser algo de interesse para a rádio, telefonei de um orelhão (não havia celulares...) e falei com uma jornalista que estava de plantão, a Luciana Frangeto. Sugeri a ela que, se pudesse, mandasse a viatura para o local (o carro, um Gol 1000, tinha uma unidade de radiofrequência que permitia entradas ao vivo na programação; não havia celulares naquele tempo). A Luciana me respondeu que não seria possível, porque o carro estava sendo usado na campanha do Almino. Depois desse dia, cheguei a ver a viatura circulando pela Praça Independência. Os logotipos da rádio, pintados no capô e nas portas laterais, eram cobertos pela propaganda do candidato.
Se o que lhe escrevi interessar para seu trabalho, use o material da forma que achar melhor.
Boa sorte,
Rafael
Se o que lhe escrevi interessar para seu trabalho, use o material da forma que achar melhor.
Boa sorte,
Rafael